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sexta-feira, julho 15, 2011

A LEVE E CLARA ARGUMENTAÇÃO DO SENSÍVEL












Pinturas de Isabel Sabino

O visível é um fenómeno complexo da nossa natureza, por vezes relacionável com o invisível ou a denegação do real. Vimos aqui, não há muito tempo, um notável conjunto de obras de Isabel Sabino, cuja poética e cuja estética se podem evocar, em perfeita coerência, com as actuais peças, o melhor que conhecemos na ordem rapidamente esquecida da pintura anacrónica. Havia naquelas obras talvez um segredo, da pintura ou do real ou dos conceitos algo paradoxais que atravessavam as cenas de um provável jardim, espaço revisitado na óptica do humano mas a perder-se, inútil, na espessura pouco encorpada do seu abandono ao vazio. Após um eventual desastre, as ausências sucederam-se e as imagens que podíamos contemplar traziam em si uma inefável relação entre a morte e a beleza.
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Associemos esta espécie de paradoxo à famosa sequência do fotógrafo, em Blow-Up: julgando ver e fotografar uma cena de amor, o seu dom operativo, na manipulação dos negativos, revelou-lhe que a sequência antecipava um crime. Uma hipotética cena de amor torna-se no grão fotográfico de uma cena de assassinato. Há algo de parecido com o mistério da piscina, nos anteriores trabalhos de Isabel Sabino e o seu actual jardim
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«Aguarelando» sem rebuço através de tintas acrílicas, Isabel parece fazer aquilo que é recorrente nos ginásios, exercícios de aquecimento, coordenando a mancha, a gestualidade e a minúcia de uma aventura de ambíguo destino. Há mais experiências destas, por vezes paradoxais ou despojadas de algum assunto sustentando um tema.
Se olharmos para as obras que abrem o pano após estas (fotografia convocada para várias sustentabilidades) a luz é nitidamente m ais afirmativa, de uma poética fresca, apelando a todos os elementos figurativos para essa solidez matinal, entre plantas e leves construções, que podem lembrar composições cénicas, porventura mesmo cinematográficas, de certas escritas da arte britânica, diluições brumosas, quase sem sombras, onde tudo parece recuperado de um património cultural já aberto, lúdico, sem crispações. São, além do mais, um belíssimo uso da pintura representativa para investigar todos os géneros dela. A embriaguez expositiva do século XX tem tudo a ver com isto: porque, quanto mais se desmanchava por dentro e por fora de si própria, aproximando-se do seu motor invisível, mais espectáculo produzia, sem título, mas ruidosamente, ou elegendo estruturas mínimas, tintas solitárias, sempre em volta de uma descoberta verdadeiramente decisiva, por implosão ou imagem minimalista. O facto é que, sempre depois das contas, nada que mudasse o mundo aconteceu de facto sob a brutalidade dos experimentalismos todos, mega suportes, rias singelas.
Voltemos a Isabel Sabino no País das Maravilhas. Os lugares para os quais ela nos convida são imediatamente admiráveis: são paisagens de sítio nenhum. A autora quer aspirar ao aprazível e ao jogo de encenar figuras e objectos naquela paz silenciosa. Há aqui uma pintura representativa mas não mimética nem académica. Então, damo-nos conta de que o tempo já passou por ali, nódoas, rachas nas paredes, chão fino de quase nada, partes de um puzzle que Isabel, pensando o lugar, o ser e o ver, reboca para um tempo humanista que tende a recuperar o céu. Brincando. Numa leve e clara argumentação do sensível. Um mundo narrado assim, enquanto a pintora aponta atmosferas brancas, líricas, e «debaixo das folhas das árvores voando pétalas amarelas e verdes ou violetas», as flores do nosso imaginário.
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Do artigo «Sem paisagem, na paisagem» cuja publicação no JL falhou por um incidente técnico.

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